Baixo Sul da Bahia: Território, Educação e Identidades

Fábrica dos Ingleses [Maraú-BA]

A exploração do Petróleo e de seus derivados começou na Bahia, mais exatamente às margens do rio Maraú, mas poucas pessoas sabem disso. A península de Maraú hoje tem sua importância devido ao potencial turístico, entretanto, a partir da segunda metade do século XIX até início do seguinte, o foco era outro, bem diferente. Nessa época, a economia do sul da Bahia girava em torno da produção de produtos primários, mas a novidade da descoberta de petróleo, carvão, turfa e xisto betuminoso (espécies de combustíveis fósseis) na vila de Maraú levou grande novidade e causou alvoroço na região.

 

A partir de 1847 Maraú foi, por quase um século, palco de conflitos e estudos do seu subsolo em busca de tais riquezas, sobretudo do carvão de pedra, produto imprescindível para o desenvolvimento industrial. João da Costa Junior (negociante e comendador) foi o primeiro nome citado dentre os interessados nesta exploração. Depois dele, seus filhos formaram um consórcio e, por serem herdeiros do mais antigo requerente e por estarem teoricamente procedendo à exploração desde 1854, pediram ao governo imperial o direito de explorar o subsolo, alegando tal pioneirismo, mas sem sucesso.

 

Mesmo depois de muitos pedidos, requerimentos, contestações etc. por parte deste grupo, em 1869, foi concedida a Edward Pellew Wilson – escocês e comerciante conhecido nas praças de Salvador – permissão por 30 anos para lavrar carvão de pedra, turfa e outros minerais nas margens do Rio Maraú. Ele fez questão de deixar claro que não usava mão de obra escravizada, afirmando categoricamente que seus trabalhadores eram todos livres. Empregando em torno de 60 homens nessas explorações, numa região de população predominantemente negra, podemos deduzir que boa parte de seus trabalhadores também o fossem. Isso nos mostra um aspecto ainda pouco estudado da nossa história, a saber, o trabalho livre num período em que o Brasil ainda era um país escravista. E tem mais.

 

Aproximadamente 20 anos depois, parte dessa autorização foi transferida para seus compatriotas John Cameron Grant e Lord Walsingham, que abriram uma fábrica para produzir ácido sulfúrico, velas, sabão e sabonete na fazenda João Branco, a John Grant & Company. Este empreendimento chegou a empregar em torno de 300 funcionários, entre estrangeiros, brasileiros de outras regiões e população local, algo inédito na região. A grande maioria destes trabalhadores eram negros livres e libertos, chamados nos documentos de sertanejos, homens “de cor” etc.

 

Trabalhadores da Fábrica. FONTE: Ubaldo Senna, acervo particular.

Um desses tentou matar seus patrões britânicos em 1889, revoltado pelas explorações sofridas, mas acabou se tornando vítima da própria fúria, e foi morto. O processo caminhou na justiça por um ano e, depois disso (ou, talvez, por causa disso…), a fábrica foi vendida à Companhia Internacional de Maraú e John Grant voltou para a Inglaterra.

 

Por: Rute Andrade Castro, doutora em História Social e professora da UNEB, Campus XIV.

 

Quer saber mais?

 

CASTRO, Rute Andrade. Entre a aventura e o preconceito: trabalhadores sob a mira britânica. Salvador: EDUNEB, 2022.

 

______________. Vestígios de uma fábrica britânica em fotografias de seus trabalhadores. Transversos, n. 10: 102-119, 2017.

 

______________. Questões resolvidas a bala: O que dois crimes são capazes de revelar sobre os mundos do trabalho. História Unisinos, janeiro/abril 2023.

 

SANTOS, Cristiane Batista. 2019. Histórias de africanos e seus descendentes no sul da Bahia. Ilhéus – Ba, Editus.

 

TEIXEIRA. CID. História do Petróleo na Bahia. Editora Fernando José Caldas Oberlaender: Salvador – BA, 2010.