Baixo Sul da Bahia: Território, Educação e Identidades

Zambiapunga

Entre as enxadas da lida e os búzios do mar – NZambi nas terras costeiras do Baixo Sul da Bahia, vamos conhecer o Zambiapunga uma manifestação cultural que é Patrimônio Cultural do estado da Bahia. Vamos começar pela etimologia da palavra para que possamos seguir os rastros da origem desse bem cultural imaterial? Pois bem, vamos olhar o que nos diz a linguista Yeda Pessoa de Castro em sua obra Falares Africanos na Bahia – Um Vocabulário Afro-Brasileiro: Zambi = Deus Supremo; Nzambi ampunga = Deus todo poderoso; Zamiapunga = grupo de mascarados (homens e mulheres) que se apresentam, pela madrugada, em diferentes datas, nas ruas das cidades de Cairú, Taperoá, Valença e Nilo Peçanha, com trajes e chapéus festivos percutindo enxadas e fazendo soar búzios de pesca.(CASTRO, 2001, p. 355).


Zambiapunga e Caretas de Cairú. Autora: Nara Gomes. Dezembro de 2015.

Quanto à etimologia da palavra Zambiapunga, nos reporta a priori a sua origem africana, inscrita no grupo linguístico Bantu composto por muitas etnias. De acordo com a historiografia da escravidão no Brasil, os primeiros escravizados em terras brasileiras pertenciam ao grupo etnolinguístico Bantu, identificados pelas etnias à época denominadas de congo e angola. Esses povos ocupavam a faixa territorial que compreende atualmente os países República Democrática do Congo e Angola. As memórias dos mestres do Zambiapunga apontam que era uma “brincadeira” de longa data, reportando-se há tempos imemoriais, que através da oralidade vem sendo transmitida de geração em geração.


Um desses Mestres é o Sr. Valter Viana, um dos fundadores da Escola Cultural e Profissionalizante Zambiapunga Porto dos Milagres de Valença, ele aponta uma curiosidade que difere o Zambiapunga de Valença dos demais. O cortejo saia pelas ruas de 31 de dezembro para 01 de janeiro, na virada do ano. As suas roupas não eram coloridas, eles se vestiam todos de branco, alguns homens andavam descalços, pois, nem todos naquela época tinham condições financeiras que lhes permitissem comprar um calçado. As roupas brancas eram feitas com sacos que eram utilizados para o armazenamento do açúcar. A manifestação cultural em Nilo Peçanha sai pelas ruas na madrugada de 31 de outubro para 01 de novembro, o cortejo do Zambiapunga traz um colorido à madrugada do primeiro dia do mês de novembro em Nilo Peçanha. As roupas coloridas em tons diversos, as máscaras carregadas de idiossincrasias – pois o mistério e horror fazem parte da sua criação pelos participantes – , os instrumentos percussivos (enxadas, caixas, cuíca) e os instrumentos de sopro (búzios), todos têm um significado na composição da manifestação cultural e o objetivo central é o de espantar os maus espíritos. Ao buscarmos na literatura observamos que a utilização das máscaras para espantar os maus espíritos, não é um costume apenas dos grupos de Zambiapunga na Bahia, temos tal costume entre povos de países africanos, ou seja, essa tradição esta inscrita ancestralidade dos povos que criaram o Zambiapunga.


Vamos agora para Cairú que é reconhecida pelos demais grupos de Zabiapunga, como o local onde se originou a manifestação cultural, existindo essa versão para o mito fundador, porém como já mencionado sem uma datação específica, conta-se que um dos mestres de Zambiapunga teria migrado de Cairú para Nilo Peçanha e levado a tradição dos Caretas como é chamado o Zambiapunga em Cairú. Podemos perceber as relações entre os grupos e mestres, pois todas as cidades estão muito próximas Cairú, Nilo Peçanha, Taperoá e Valença, mas cada grupo se distingue pelas roupas usadas, pelas datas em que se apresentam e há quem diga que pelo toque do tilintar das enxadas e o soar dos búzios.


Adriana Cerqueira Silva – Antropóloga – Mestranda em Estudos Étnicos e Africanos – Pós-Afro – UFBA. Técnica em Antropologia na Gerência de Patrimônio Imaterial do IPAC- BA.


Quer saber mais?


Caretas e Zambiapunga – Bahia Singular e Plural


Memória e Patrimônio Cultural do Baixo Sul: à quem interessa?


ARAÚJO, Nélson de. Pequenos mundos um panorama da cultura popular da Bahia: tabuleiros de Valença, o folclore da região cacaueira e do Extremo Sul, a Bahia pastoril, Extremo Oeste. Salvador: UFBA/Secretaria de Cultura e Turismo do Estado da Bahia/Fundação Casa de Jorge Amado. 1996. v.3. 200 p.


CARETAS E ZAMBIAPUNGA. Direção e produção: Josias Pires. Realização: Ednilson Mota. Serie Bahia Singular e Plural. Bahia. IRDEB & TVE_BA. 1978. Bahia: Irdeb, 2000 (33min).


CARVALHO, Cristina Astolfi. Caretas e Zambiapunga: A influência Centro- Africana na Cultura do Baixo Sul (BA) e a História da Região. Orientador: Marina de Melo e Souza. – São Paulo, 2020. 261 f.


BIANCARDI, Emília. Raízes Musicais da Bahia. Salvador: Secretaria da Cultura e Turismo. 2000.


IPAC-BA. Dossiê para a instrução do processo de Registro Especial da manifestação cultural: Zambiapunga e Caretas do Baixo Sul. Salvador: Diretoria de Preservação do Patrimônio Cultural – DIPAT/Gerencia de Patrimônio Imaterial – GEIMA. 2017.