Localizado no município de Aratuípe, Bahia, Maragogipinho faz da cerâmica uma das atividades mais importante da região. Situada no Território do Baixo Sul da Bahia, a população divide-se entre o trabalho artesanal, o trabalho no mangue e as tarefas domésticas, além de praticar a caça e a pesca para sua subsistência.
Atualmente, o distrito de Maragogipinho é considerado o maior polo cerâmico da América Latina. O vilarejo, cujas origens remontam ao século XVI, foi inicialmente organizado para fins de catequização indígena, tendo ficado conhecido, no período colonial, como Aldeamento de Santo Antônio. Com o passar do tempo, em que pese o agressivo processo de colonização que perpassa toda a história do Bahia e do Brasil e, como indicado, a própria conformação original do local, o que se observa é que muitos costumes Afro-indígenas (estão presentes nas peças produzidas pelos artesãos de Maragogipinho desde a retirada do barro (geralmente das margens do rio Jaguaripe), nos tipos de peças, nas construções das olarias, nas cestarias, na técnica de extração das tintas naturais (tauá e tabatinga), como também nas pinturas das peças e no uso da madeira que alimenta os fornos das olarias da comunidade. Já a herança dos costumes africanos é perceptível nos padrões de pinturas das peças, mas também na produção de esculturas, na modelagem da cerâmica, na reprodução de muitos utensílios e até na própria constituição identitária dos artesãos e artesãs da comunidade) foram incorporados na organização da comunidade ao longo dos séculos, sobretudo nos hábitos cotidianos, culturais e linguísticos, bem como no desenvolvimento da atividade artesã com a argila, que veio a se tornar o principal meio de subsistência dos moradores da localidade.
Uma comunidade tradicional, um lugar expressivo e representativo do ofício ceramista. Há apenas 15 minutos de carro, contando a partir da entrada do distrito, encontra-se um lugar que tem em torno de 3 mil habitantes e mais de 200 olarias — um cenário composto por poucas ruas, em sua maioria já pavimentadas, mas que preserva a característica histórica em suas pequenas casas coloridas e algumas construções de pau a pique.
Como um lugar de resistência política e artística, em que os objetos têm vozes, ainda que dissonantes e divergentes, o legado de Maragogipinho não se restringe à tradição de transformar barro em arte, o que já seria imenso, mas também no fato de que, nos objetos produzidos, é possível ver (e ler) processos formativos, marcas identitárias, heranças históricas e saberes Afro-indígenas dinamizados. A prática artesã na região, dos oleiros, santeiros e brunideiras mantém viva a tradição de atividades ceramistas que, segundo as histórias orais correntes, se iniciou na vila por volta de 1649 e não parou mais.
Os processos de preservação e de atualização de um legado sócio-históricocultural faz de Maragogipinho um lugar geográfico e poético, estruturado pelos saberes sobre o barro, tornado arte ceramista; um lugar em que sujeitos, saberes e práticas se reformulam incessantemente, por vezes, de modo agonístico.
Por: Joseane Costa Santana, licenciada em Letras / Espanhol, mestra em Ensino e Relações étnico-Raciais e professora do IF Baiano Campus Valença.
COMUNIDADE QUILOMBOLA BOITARACA
ALVARES, Sonia Carbonell. Maragogipinho — as vozes do barro: práxis educativa em culturas populares. 2015. Tese (Doutorado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2015. Disponível em: https://teses.usp.br/teses/disponiveis/48/48134/tde-11052016-163601/publico/SONIA_CARBONELL.pdf.
AMORIM, Crislane Ribeiro de. Impactos ambientais e sustentabilidade da atividade oleira no distrito de Maragogipinho, município de Aratuípe, Bahia. 2016. Monografia (Graduação em Engenharia Sanitária e Ambiental) – Centro de Ciências Exatas e Tecnológicas, Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, Cruz das Almas, 2016. Disponível em: http://www.repositoriodigital.ufrb.edu.br/handle/-123456789/1033.
CENTRO NACIONAL DE FOLCLORE E CULTURA POPULAR – CNFCP. Maragogipinho e a tradição do barro. Rio de Janeiro: IPHAN; CNFCP, 2009.
MOTA, Urânia Teixeira. Louça de Deus: o caxixi em Maragojipinho. Salvador: Fast Design, 2011.
SCARANTE, Ionã Carqueijo; SANTANA, Joseane Costa (org.). Mãos que inspiram a poesia: a arte de Maragogipinho traduzida em versos e ilustrações. 2. ed. Valença: IF Baiano, 2020.
Projeto conduzido pelo Grupo de Pesquisa NEABI do IF Baiano (CNPq), sob coordenação das docentes Dra. Nelma Barbosa e Ma. Scyla Pimenta, no âmbito do curso de Especialização em Relações Étnico-Raciais e Cultura Afro-brasileira na Educação (REAFRO) e do Núcleo de Estudos Afro-brasileiros e Indígenas (IF Baiano Campus Valença).
Contato: nelma.barbosa@ifbaiano.edu.br